O que estou
prestes a relatar aqui foi um insight que acabei de ter; uma descoberta que me
foi revelada após a junção de duas ideias que ficaram parasitando na minha
cabeça e que são oriundas de dois acontecimentos separados e diversos entre si.
Os dois acontecimentos a que me refiro são: 1º a leitura de uma entrevista
recente dada pelo Alan Moore ao The Guardian e, 2º a minha decisão de parar de
assistir a Game of Thrones depois do término da 3ª temporada, devido aos
acontecimentos do traumático “Red wedding”.
Primeiro,
estava divagando sobre uma sacada do Alan Moore dada na entrevista citada que
achei bastante perspicaz. Na entrevista, o Alan repreende os espectadores e os
roteiristas contemporâneos por estarem cultuando e ressuscitando os super-heróis.
Pro Alan, esse culto está poluído de nostalgia, escapismo e soluções fáceis que
nós, contemporâneos, estamos inadvertidamente buscando em nossas histórias; é
como se nós tivéssemos nos reportado ao passado (sobretudo à cultura
estabelecida e confortável do passado) onde os super-heróis foram criados e cumpriram
suas funções sociais e, porque escolhemos olhar para o passado, tivéssemos
esquecido do presente, isto é, tivéssemos abandonado a empreitada de encontrar
soluções criativas e novas para os nossos problemas atuais. É irresistível não
ver no “Capitão América: O soldado invernal” um exemplo privilegiado dessa
crítica do Alan.
Não
me entendam mal, leitores! Sério! Sou fã de super-heróis, não de todos, mas de
alguns. Mas é justamente por ser fã de super-heróis que entendi o que o Alan quis
dizer e, mais ainda, entendi que eu gosto de super-heróis, em grande medida,
pelas causas que o Alan apontou! Ficou claro para mim, por exemplo, porque
gostei tanto do “Capitão América: O soldado invernal”, pois, no filme, vemos
como o Rogers passa grande parte do tempo tentando entender os tons de cinza do
mundo contemporâneo. O Capitão é um personagem da década de 40, da década Eixo VS
Aliados, da década preto e branco da Segunda Guerra Mundial, nela era fácil
escolher um lado, era fácil identificar o que estava errado e o que precisava
ser feito, mas esse não é o mundo de agora, e por isso Rogers está tão perdido.
Tão perdido – devo dizer – quanto eu estou perdido tentando encontrar algum
ponto fixo neste mundo que parece se reconstruir a cada dia, a cada hora.
Saudosismo,
escapismo e o desejo de uma solução fácil...
Sem
fechar muito, passo ao segundo ponto, que era a minha decisão de parar de ver
Game of Thrones após o “Red wedding”. Bem, não preciso dizer aqui o quão
traumática e inesperada é a sequencia do “Red wedding”. A cena foi tão traumática
para mim que, após assisti-la, decidi que não mais acompanharia GOT. Pensei várias
coisas durante este tempo que estou sem ver a série: fui desde sentimentos de
ódio por George R. R. Martin até análises especulativas sobre as inovações e quebras
de paradigmas que o roteiro de GOT está introduzindo na mente do público. Mas o
ponto crucial para mim é que eu não consigo entender a morte súbita de
personagens de quem eu vim a gostar tanto. Continuar a assistir a série, para
mim, parecia como um ato masoquista e eu não percebo em mim nenhum traço
masoquista. Daí a contradição! Nem a curiosidade de saber o que acontecerá com
certos personagens foi suficiente para vencer a decepção de ter visto a quase
total destruição da família Stark que teve início no fim da 1ª temporada. Mais
do que não entender sobre o que é, afinal, a história de GOT, achei de extremo
mau gosto brincar com o público por tanto tempo, fazendo-nos engolir doses de
violência gratuita apenas para por fim à casa cujo objetivo era apenas
restaurar a justiça em Westeros. Não sei sobre vocês, mas no solo cultural onde
eu cresci não se escrevem histórias assim!
Até que...
E
agora chego ao ponto de síntese que me foi revelado pelo insight que tive.
Basicamente, me dei conta de que Game of Thrones é a narrativa contemporânea de
que o Alan Moore sente falta no mundo de hoje! Mais ainda, me dei conta também
da razão pela qual a série é tão difícil para mim: não é porque nela foram
mortos personagens de quem fui levado a gostar – não! – é porque, na série, estou
testemunhando a morte brutal de personagens cujas virtudes não têm mais lugar
no mundo de Westeros. Em poucas palavras, caso não tenha ficado claro: em GOT, heróis
são mortos! Mais do que não optar por soluções fáceis, em GOT, essas soluções são
impossíveis, pois não há um herói a quem recorrer. Foi esse o insight que tive
e é assim que entendo atualmente a série. Não sou capaz de antecipar, nem em
linhas gerais, os caminhos que a narrativa seguirá. Mas, se a minha comparação
entre a série e os tempos atuais tem alguma validade, então acredito que
teremos um final decepcionante, pois, para um final satisfatório, precisaríamos
de um autoconhecimento que não está ainda à nossa disposição, nem no campo científico,
nem no campo da ficção artística. Enquanto muitas coisas estão ainda para
acontecer, na série com a 6ª temporada e no mundo com todos os seus complexos
acontecimentos, acho que, pelo menos, encontrei uma boa razão para continuar
assistindo a GOT, pois quero, no mínimo, testar as especulações levantadas aqui.